Liane Maya, uma das personalidades mais versáteis do teatro musical brasileiro, se destaca por sua carreira multifacetada como atriz, cantora, bailarina, coreógrafa e diretora. Com formação em instituições renomadas como O Tablado, o Conservatório Nacional de Música do Rio de Janeiro e a Escola de Música Villa-Lobos, além de estudos em Nova York e sob a tutela de renomadas professoras de Ballet Clássico, Maya possui um currículo acadêmico impressionante que reflete sua dedicação às artes cênicas.
Ao longo de sua trajetória profissional, Liane participou de mais de 25 produções teatrais, conquistando elogios por suas atuações em espetáculos como “As Damas de Paus”, “Crazy For You” e “Além do Ar – Um Musical Inspirado em Santos Dumont”. Este último lhe rendeu indicações ao Prêmio Bibi Ferreira. Seu talento também brilhou em produções como “A Família Addams”, “Cabaret”, “Noviças Rebeldes” e “Gypsy”. Atualmente, ela enfrenta o desafio de interpretar Velma Von Tussle no musical “Hairspray“, a antagonista cuja complexidade requer uma performance marcada pela crueldade e preconceito.
Paralelamente ao seu trabalho no teatro, Liane está pronta para apresentar ao público Dona Zefa, uma nova personagem na série musical “Uma Garota Comum”, produzida pelo Disney+. Este projeto marca seu retorno às telas após participações memoráveis em programas icônicos como “Planeta dos Homens” e “Escolinha do Professor Raimundo”.
Em entrevista exclusiva à revista Manequim, a atriz falou sobre os desafios de dar vida a personagens com valores retrógrados e a responsabilidade de representar questões sociais relevantes através da arte. Veja a seguir:
1. Como foi para você, Liane, mergulhar na personalidade de Velma Von Tussle, uma personagem tão diferente e oposta aos valores inclusivos e diversos que o próprio musical “Hairspray” celebra?
“Eu como atriz me interesso pelo universo do ser humano e mergulhar na personalidade de Velma Von Tussle, a vilã do musical ‘HairSpray’ foi um desafio. Além de Velma ser meu oposto,tive que criar um corpo e uma voz que caminhassem juntos na interpretação”.
“Eu não poderia tomar partido e teria que mergulhar até o fim na crueldade e preconceito, para ser o contraponto da idealista Tracy Turnblad. Sabia que tinha uma responsabilidade em mostrar com esse personagem a intolerância e o preconceito de Baltimore dos anos 60 e que também temos vivido em vários momentos da nossa história recente”.
2. O musical “Hairspray” levanta questões sérias sobre racismo e intolerância, temas que Velma representa. Como é para você lidar com essas questões em cena e como você espera que o público reaja ao papel da sua personagem na trama?
“Minha personagem levanta questões dos anos 60, porém muitas vezes escondidas em entre linhas nas atitudes e no comportamento da nossa sociedade atual”.
“A reação do público é muito direta em relação a vilã da história, que desde a primeira cena se apresenta preconceituosa até o momento final, quando o programa está ao vivo e finalmente elas são desmascaradas e perdem tudo”.
3. Interpretar uma personagem tão marcante e com valores retrógrados pode ser desafiador. Você encontrou algum aspecto de Velma que conseguiu entender ou pelo menos explorar com um olhar empático?
“Bom, quando a gente levanta um personagem as perguntas são bem diretas: Qual é o seu sonho? De que você tem medo? Qual é a sua frustração? Essas perguntas são feitas e claro que a empatia acontece quando você começa a mergulhar na psique da personagem e descobre o quanto ela não teve amor, foi criada tendo que ser a melhor,foi rejeitada e teve seu sonho frustrado. Esse mergulho faz com que o personagem se humanize e você passe a entender suas motivações e justificativas”.
4. Sua carreira é marcada por trabalhos diversos, do humor na televisão aos palcos dos musicais e à música com As Frenéticas. Como essas experiências moldaram sua visão sobre o mundo das artes e influenciaram sua forma de atuar?
“Eu comecei a minha formação no ballet clássico e no canto lírico, em seguida veio a Escola de Teatro Tablado. Eu comecei a atuar com 15 anos, como protagonista da primeira direção de musical do diretor Wolf Maya e depois continuei com uma carreira extensa em musicais nacionais e internacionais”.
“Aos 18 anos fui para a TV Globo contracenar com os gênios da comédia: Jô Soares e depois nos programas do Chico Anysio e a ‘Escolinha do Professor Raimundo’ no papel de Dona Clarinha. Fiz novelas e séries da Globo, fui diretora e coreógrafa de Teatro e TV, tive muitas bandas de Rock e Soul e fiz parte de uma das formações do grupo ‘As Frenéticas’ durante 8 anos”.
“Além disso, comecei a dar aulas na CAL, escola de formação de atores no Rio por 30 anos seguidos de Teatro Musical e corpo e voz para o ator da cena. Esta experiência tão diversificada em várias áreas, com certeza foram fundamentais para a artista que sou hoje”.
“Hoje sou uma atriz que mergulha tanto no drama como na comédia. Os mestres que tive no canto, dança e teatro e os diretores que tive o privilégio de trabalhar, foram fundamentais para que eu hoje, humildemente, os reverencie e tenha imensa gratidão pelos conhecimentos que recebi”.
5. Como você se sente ao saber que seu trabalho como Velma pode estar ajudando o público a refletir sobre temas como racismo e preconceito, e qual mensagem você espera que essa interpretação deixe?
“Eu sou uma artista comprometida com a arte que transforma e faz refletir. Tenho certeza que mesmo dentro de uma comédia musical, a personagem Velma Von Tussle está cumprindo a missão de fazer o público refletir seus valores com os temas: racismo, homofobia, gordofobia, etarismo e padrão de beleza na sociedade.
Espero que esses temas sejam cada vez mais discutidos e colocados em cena para que a sociedade avance com o respeito à diversidade e a liberdade de sermos uma sociedade livre”.